quarta-feira, 12 de fevereiro de 2020

O CA Notícias conversou um pouco com a autora que nos falou um pouco acerca da história de Alice.
1. Susana, pelas suas próprias palavras: de que se trata “Alice no País das Sapatilhas”?

É uma história sobre uma adolescente dos dias de hoje, a Alice, que passa grande parte do seu quotidiano online, a postar nas redes sociais e no seu blogue, até ao dia em que fica sem Internet. Quando os seus pais se mudam para uma aldeia ficcionada de Trás-os-Montes, onde não há sequer rede de telemóvel, ela fica completamente offline. E tem de se adaptar à nova realidade.
2. O que a inspirou a escrever um livro focado na temática “os jovens e a internet”?
Em primeiro lugar, eu queria escrever uma história para adolescentes e pré-adolescentes. Já se sabe que é um público que tem vindo a perder hábitos de leitura, em grande parte por causa da tecnologia e da Internet, mas também porque não há muitos livros com histórias que os cativem.
Na tentativa de se passarem grandes mensagens, mensagens transformadoras, muitos livros não partem da premissa básica, que é retratar um universo com o qual os jovens se identifiquem e se relacionem… E eu quis, antes de mais, escrever sem artifícios e moralismos.
É uma história simples, de uma adolescente dos dias de hoje, com dramas e desafios comuns a qualquer jovem da sua idade. Sendo que, lá está, esses dramas e desafios da adolescência já não podem ser abordados como há 10 anos atrás, porque hoje existem as redes sociais. E isso muda tudo!
3. No seu ponto de vista que traços tem a personagem principal em comum com muitos jovens atualmente com a mesma idade?
Tudo em comum. A Alice não consegue imaginar a sua vida sem o seu smartphone e a Internet. Tem um blogue no qual deposita as suas ambições de futuro porque sonha ser Fashion Blogger, como muitos jovens também sonham ser Bloggers, Youtubers, Instagrammers ou Influencers. E o próprio quotidiano da Alice não passa sem o acesso constante à Internet, nem que seja para falar no chat com as amigas, que estão a um metro dela. Ela começa a namorar por Facebook, por exemplo. Às tantas, o rumo da sua vida constrói-se nesta intermitência constante entre o offline e o online. Tudo isto é cada vez mais o retrato desta nova geração.
4. A personagem principal aparentemente muda-se para um meio rural no qual não tem ligação à Internet. Como imagina que muitos jovens reagiriam e se adaptariam a este tipo de situação na vida real?
Pois, esse é o grande desafio da Alice e também o desafio que é proposto indiretamente a todos os que lerem a história: e se, de repente, ficassem sem Internet? Como é que passavam os dias sem redes sociais? A reação imediata não ia ser boa, como a da Alice também não é, mas depois tem de haver adaptação.
E é nesse processo de adaptação que se descobrem coisas muito interessantes, redescobrem-se interesses como ler um livro ou simplesmente apreciar uma paisagem, vivem-se as amizades e as paixões de forma mais intensa, mais verdadeira… Enfim, no fundo reaprende-se a viver. Porque para quem sempre viveu permanentemente online, de repente há todo um mundo offline para descobrir.
5. Que tipo de situações e lições poderemos esperar deste livro? Considera este livro mais dirigido aos jovens, ou acredita que os adultos também poderão apreciar esta história?
Este é, sem dúvida, um livro para jovens. É o universo da adolescência que serve de mote à história e, como tal, as lições que dela se retiram são nesse contexto da adolescência. Mas a principal mensagem, a de que podemos ser felizes offline, serve também para os adultos, claro. Até porque não são só os jovens que perdem a noção de como passam demasiado tempo online, isso também acontece com os adultos.
Portanto, esse exercício de pensarmos “então e se a Internet não existisse na minha vida” vale para todos. Ainda que a história esteja contada em linguagem mais jovem, porque é a Alice a narradora, os adultos também podem aprender uma coisinha ou outra com a protagonista. Quanto mais não seja, aprendem um bocadinho mais sobre o universo dos filhos, se eles tiverem idades próximas dos 15 anos.
6. Pessoalmente, a Susana revê-se de alguma forma na história da protagonista Alice?
Não. E esse foi um exercício giro para mim, pôr-me no papel de uma adolescente que nasceu e cresceu com o facilitismo das tecnologias móveis e da Internet. Eu nasci e cresci numa pequena aldeia do distrito de Viseu, sem praticamente qualquer contacto com tecnologias até entrar na universidade. A televisão foi a única tecnologia na minha vida até aos 15 ou 16 anos, mais ou menos. Eu vinha da escola e ficava colada ao ecrã da televisão para ver a Rua Sésamo, mas era só isso. A maior parte do meu tempo passava-o na rua, a brincar. Quem diz a Rua Sésamo diz séries como Marés Vivas ou O Justiceiro, já na pré-adolescência.
E foi nessa altura que surgiram as primeiras consolas de videojogos domésticas e eu comecei a fazer maratonas de Spectrum com o meu irmão. A Internet só existia na escola, numa sala com vários computadores ligados em rede, mas nem me recordo ao certo do que lá fazíamos. Como é óbvio não existiam redes sociais e ter Internet em casa, ou num telemóvel, era só para alguns. Eu recebi o meu primeiro telemóvel aos 17 anos, pouco antes de entrar na universidade, e era um Nokia 3310… Basicamente só dava para fazer e receber chamadas e escrever SMS. E mesmo assim era a loucura ter um telemóvel!
7. A protagonista sonha em ser uma fashion blogger. Na sua opinião, que tipo de influência podem ter atualmente os bloggers (ou os YouTubers) nos adolescentes?
Muita, imensa. Têm tanta que os miúdos sonham em ser exatamente como eles e projetam neles a vida que gostariam de ter. Nessa medida, acho que a responsabilidade é gigante e, felizmente, os bloggers, youtubers, etc. têm cada vez mais noção desse impacto. Apesar de proliferarem blogues e canais de Youtube, os que resistem e perduram no tempo são os que demonstram mais preocupação com o conteúdo.
8. Quão diferente sente que é escrever uma história literária em relação a um guião de televisão? Qual dos dois sente que é mais a sua “zona de conforto”?
São coisas diferentes, sim, mas têm muitos pontos em comum. E esta história em particular, a “Alice no País das Sapatilhas”, foi escrita com recurso a muitas técnicas de guionismo. As situações são bastante visuais, os diálogos muito fluidos… A própria estrutura assemelha-se à divisão por cenas de um guião de série ou telenovela.
Acho que quem for ler esta história vai sentir que a está a ver na televisão ou no Youtube, em formato de série juvenil. Digamos que o meu lado de guionista veio especialmente ao de cima com esta história, o que não quer dizer que aconteça com todos os livros que eu escrevo, mas neste fez sentido.
Os jovens querem uma leitura fácil, que remeta imediatamente para imagens, e a Alice dá-lhes precisamente isso. Também é o meu registo mais natural, devo dizer. Se tiver de escrever um livro mais pesadão, com uma linguagem rebuscada, com uma estrutura intrincada, escrevo… Mas não é a minha praia.
9. Por agora tem a ideia de lançar “Alice no País das Sapatilhas” como um livro a solo? Ou poderemos esperar uma possível continuação?
A adolescente Alice começou agora a descobrir um lado da vida que ela não conhecia. O livro “Tirem-me Deste Filme” introduz-nos a enorme mudança que se dá na vida dela, entre os 15 e os 16 anos.
Mas então e os anos seguintes? Eu acho que os leitores vão querer continuar a acompanhar a história da Alice, neste registo ao estilo de diário em que ela a conta. Acontece tanta coisa na vida de uma adolescente até aos 18 anos, e mesmo depois disso… Portanto, sim, esperam-se outras aventuras da “Alice no País das Sapatilhas” 🙂

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